sexta-feira, 24 de abril de 2015

ENVELHECER





Coisa estranha é essa de se ficar velha...
Algumas cicatrizes somem, como se a gente voltasse à infância, ensinando a esquecer, a apagar. Outras cicatrizes mudam de lugar, como se nos convidassem a pensá-las de forma diferente, sob outro ponto de vista. Novas cicatrizes vem conviver conosco...
As pontas dos dedos ficam enrijecidas como se nos dissessem: “Agarre tudo depressa! Não tenha medo. Deixe de lado a etiqueta e use mais sua ética!”
Os olhos tão velhos de esfinge sabem que os óculos de grau já se tornaram descartáveis... Descontáveis... Porque as lembranças por detrás deles entram em ebulição: quanto mais profundas, mais pululam...
É justamente quando os retratos na parede começam a doer mais forte... Os heróis nos aparecem desmascarados: bandidos, falsários, pedófilos... Quando vemos tudo, entendemos tudo, mas tudo nos é pretenso, dissimulado, escondido pelos outros...
O gosto passado, que não se repetirá, ecoa na língua, feito um agouro. O cheiro de tempo chega a alucinar, querendo que seja novamente sentido. Assim como o tato, estão presos no passado... Torturados por não se fazerem sentidos presentes.
E a vida exterior ainda prossegue, nos ameaçando: Alzheimer, Parkinson e solidão.  
De resto, só a bondade de Deus aliviando o pesadelo. Porque a Verdade não falha, mas tarda...
De resto, a eternidade.

Izaída Stela do Carmo Ornelas





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