Me detive uns cinco minutos diante de uma livraria, disposta a comprar aquele romance antigo, de damas fascinantes e cavalheiros apaixonados. Indaguei o preço, mandei embrulhar... Enfim: comprei. O pacote ficou mal feito, mas não me importei. Naquele dia eu estava muito feliz.
Continuei a percorrer as ruas decoradas de vitrines, até que percebi um gotejar saindo de meu embrulho. Rasguei-o sem hesitar, excitada por saber como ocorria o fato de um livro pingar letras na calçada. Constatei que uma página – felizmente a última – estava quase vazia.
A princípio me desesperei, pedi ajuda, pensei em chamar a polícia, mas de nada adiantou. Comecei então a catar as letras caídas: aqui está o A, logo lá na escada vi o i – custei para achar o pinguinho que rolou para o asfalto. Ali temos o L, junto com o O, C e N. Será que já encontrei tudo? Não. O rapaz da sapataria veoi me entregar, meio amassados, outro L, outro A, um M e um E. Que confusão!
A esse pé de acontecimentos, já não me sentia feliz: estava furiosa.
Li o parágrafo de onde escaparam as letrinhas e logo decifrei a palavra MELANCOLIA. Droga! Ficar tão nervosa por causa de uma combinação de sentido tão medíocre...
Subi até o alto do Edifício Brasil e de lá despejei a ingrata:
............... M E L A N C O L I A
................ M E L A ....... C O L A
....................... M A N C O
........................ L O L A
.................E L A ......... L I A
...................M E L ... C A N O A
.....................M E L A N C I A
Que se espatifou de encontro ao asfalto.