Minha
avó materna, Maria Izaltina, era uma pessoa de muitos nomes. Para os filhos,
minha mãe; para aos netos, Dindinha; para mim, Nininha.
O
sobrenome dela varia na certidão dos dez filhos que teve: de Jesus, Gomes e Moreira.
Sua personalidade forte fazia com que suas ações fossem diferentes das ações
das mulheres de seu tempo. As muitas histórias dela são necessárias. Sim! São
necessárias para os dias de hoje!
A
primeira
Uma
de suas filhas não comia quiabo. Mesa posta, na casa da comadre: uma panela de
frango com quiabo... Minha avó desculpou-se com a amiga, avisando que a filha
não comia quiabo. “Como, sim!” – corrigiu a menina. Nininha ficou quieta.
Quando chegou em casa, mandou buscar quiabo na horta, matou uma galinha e
chamou a filha pra jantar. “Não como quiabo, minha mãe. A senhora sabe...” - afirmou
a mocinha. “Come, sim! Tá de lamber os beiços!” – falou por entre os dentes,
usando um tom de voz quase debochado, que combinava muito bem com o olhar azul
educador. Chamou os outros filhos para ver. Não para comer, porque aquele
frango era somente para a atrevidinha. Nenhum de seus filhos virou mentiroso ou
falsário.
Segunda
Visitando
outra comadre, o filho da dona-da-casa era uma verdadeira pestinha. Chutou as
canelas de Nininha, bateu num de seus filhos, quebrou seu guarda-sol... Quando
a comadre se distraiu, o moleque disparou a fazer caretas, mostrar a língua e
toda sorte de disparates. Nininha chamou o menino e deu a ele um “agrado”:
dinheiro o suficiente para uma boa quantidade de doces. Esclareceu: “Que lindo!
Nunca tinha visto um menino tão engraçado e talentoso assim! Aposto que se você
fizer isso sempre, todas as outras visitas vão te dar até mais dinheiro do que
eu!”. Quando a comadre veio à casa de Nininha, “pagando” a visita, soube-se que
o moleque havia apanhado bastante e estava de castigo, por conta de
traquinagens. Sempre soubemos a verdade: por conta de Nininha! Nenhum dos dez
filhos se esqueceu de recontar este caso aos netos dela.
Terceira
Retornando
do velório de um parente, notou que um dos filhos trazia um brinquedo que não
lhe pertencia. “Apertado”, ele disse que havia encontrado o carrinho no
terreiro da casa do morto. Mesmo sendo já noite, fez com que o rapazinho
levasse de volta o objeto e recolocasse no mesmo lugar onde havia encontrado.
Claro que meu avô foi atrás, vigiando sem o filho perceber. Mas nenhum de seus
filhos virou ladrão.
Saudades
do tempo em que dignidade era a lei.
Izaida
Stela do Carmo Ornelas
Na foto acima: Madrinha Iracy, Nininha e minha mãe.