sábado, 22 de setembro de 2012

PROFISSÃO DE ÓDIO







  
Odeio meus cabelos de Bombril,
Meus falsos anseios
Que são apenas meios idiotas
De crescer mascarada e alheia.

Odeio ver alguém que se pareça
Com alguém que amei
Pois começo a ver um motivo
Que não é senão eu mesma.

Odeio minhas roupas de caipira
Bem como meu sotaque mineiro.
- Uai? Não é justo co’ nóis!
Mas também não é comigo.

Odeio minha acomodação
Em relação à vida que levo:
Viver lembrando do que deixei em MG
Em contraste ao que vivo aqui.

Odeio essas quatro paredes cariocas
Porque não são minhas
Me odeio profundamente
Porque não me pareço comigo.

Vejo ódio em linhas lindas
Pingado de meus maus olhos
Que não puderam ainda
Mostrar que amaram – e amam!

Detesto minhas limitações físicas
E mais ainda estar botando isso pra fora.
Imagina o que vão dizer as pessoas!
...

Odeio essa minha solidão.
Será que ela ainda vai durar?
Não sei.
Tento saber! Tento?

Só sei que odeio os homens
Pois me materializam, me fetichizam.
Odeio as mulheres
Pois me imprimem mais complexos
Mais e grandes!

Ódio às crianças
- purinhas –
Rindo de meus cabelos de Bombril,
De eu não ter pai, nem amigos,
Nem coração mais e nunca: nunca mais.

Odeio esse calor lá fora
E a televisão faladeira.
Odeio minha cintura, meus pés,
As pernas tortas e essa vontade nojenta
De chorar e gritar.

Agora tenho um sono odioso
Sem poder adiá-lo
Por amor ao dia que vem;
Vem ver de perto meu rosto feio
Porque irá beijá-lo.

Vou dormir um sonho
Onde você me verá sem ódio
Porque você não é ainda capaz
De, como eu, inventá-lo...
Por ter apenas o que amar.

Rio de Janeiro, 1985...



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