Num domingo como hoje, eu estava na janela, quando
passou um senhor evangélico negro, vestido de terno e gravata, com sua Bíblia
debaixo do braço. Escondida pela veneziana, gritei:
- Ô urubu-rei!
Certa da impunidade, repeti covardemente:
- Ô urubu-rei!
Foi quando senti uma pressão nos ombros... Meu pai
estava ali, bem atrás de mim...
Ele não me bateu, embora seu rosto expressasse tanta
coisa que justificaria até a violência: tristeza, vergonha, decepção,
repulsa... Ele me deu uma surra moral, quando, simplesmente, me levou até a
cozinha e explicou o significado da palavra BLASFÊMIA. Ele começou dizendo que
a pior blasfêmia é a falta de respeito para com o irmão!
Hoje o Google
define: “palavra, expressão ou
afirmação que insulta ou ofende o que é considerado digno de respeito ou
reverência”.
O que é mais digno de respeito que um pai, uma mãe, um
irmão? Quantos blasfemam contra os irmãos! Quantos semeiam a discórdia, o
preconceito, a injúria! Eu estava entre eles! Não tinha aprendido a respeitar.
Aquele senhor era, com certeza, uma pessoa muito melhor do que eu. E eu, na
ignorância de meus oito ou nove anos, achava que era superior... Ledo engano!
Quando conheci a doutrina evangélica, professada por
aquele senhor, entendi que eles tinham mesmo muitas razões para protestar!
Através do estudo da História, analisando a Inquisição, entre outros fatos,
passei a ver que os próprios homens deseducam os homens; que Jesus é sempre
jogado de lá para cá, conforme interesses pessoais e institucionais. Mas que a
maioria dos “pecados” reside na ignorância. E só tem autoridade para julgar,
Aquele que tudo conhece, que tudo sabe! Quem somos nós? Quem somos nós, afinal?
Santos? Demônios? Acredito que somos Filhos e Irmãos! Só o Pai reconhece!
Quando xinguei aquele senhor, manchei a mim mesma!
Quando alguém injuria outrem, tenho certeza de que acontece o mesmo! Blasfêmias
deixam marcas nos lábios de quem as profere. Marcas que só o amor e o
entendimento podem apagar. Perdão...
Meu pai, naquele domingo, me deu formação e daí eu
parti em busca de informação!
Agradeço a ele por esse dia! Não tenho, por isso, a
índole leviana de comentar o que não conheço! Gratidão eterna, como ensinam os
amigos!
Mais uma lição, do mesmo dia:
Muito sábio, aquele senhor - negro e evangélico -
sequer olhou pra trás! Deixou-me ali, com minha insignificância...
Em tempo, a Lei: a Lei
9.459, de 1997, considera crime a prática de discriminação ou preconceito
contra religiões. Ninguém pode ser discriminado em razão de credo religioso. O
crime de discriminação religiosa é inafiançável (o acusado não pode pagar
fiança para responder em liberdade) e imprescritível (o acusado pode ser punido
a qualquer tempo). A pena prevista é a prisão por um a três
anos e multa.
Izaída Stela do Carmo Ornelas